Quando Nicolás Maduro foi empossado como presidente pela primeira vez, em 2013, a democracia venezuelana já se encontrava profundamente degradada. Seu antecessor e mentor, Hugo Chávez, aproveitara a popularidade resultante de preços recordes do petróleo para aparelhar as instituições e se perpetuar no poder, de 1999 até a morte naquele ano.
Apesar de todo o poderio do governo, a vitória eleitoral de Maduro se deu por margem minúscula, de 50,6% dos votos.
Na segunda posse, em 2019, a bonança econômica havia dado lugar a uma catástrofe econômica e humanitária —e a Venezuela já era governada de modo ditatorial. O regime não aceitara a vitória da oposição no pleito para o Legislativo e criara uma farsesca Assembleia Constituinte; adversários na disputa pelo Executivo foram cerceados pelo Judiciário.
Para viabilizar a terceira posse, ocorrida nesta sexta-feira (10), o chavismo abandonou os parcos escrúpulos democráticos que ainda encenava. Fraudou descaradamente as eleições do ano passado, depois de haver prometido uma disputa limpa em acordo endossado por Estados Unidos, Brasil e outros países; o real vencedor, Edmundo González, está exilado na Espanha.
A repressão se tornou mais sanguinária. Em outubro, o Conselho de Direitos Humanos da ONU documentou 25 assassinatos e mais de 1.500 prisões arbitrárias, das quais nem crianças escaparam. Nos últimos dias se retomou com intensidade a perseguição a adversários. A oposição afirma que a líder María Corina Machado chegou a ser detida.
Foi necessária a desmoralização aos olhos do mundo para que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se afastasse da ditadura e não reconhecesse o resultado proclamado das eleições. Até então Lula se desmanchava em mesuras a Maduro e chegou pontificar que “o conceito de democracia é relativo” ao discorrer sobre o regime do aliado ideológico.
Outros líderes da esquerda continental foram mais assertivos, como o presidente do Chile, Gabriel Boric, que acusou a fraude e, mais recentemente, retirou o embaixador em Caracas. Seu congênere colombiano, Gustavo Petro, divulgou vídeo denunciando as violações de direitos humanos no país fronteiriço.
A aprofundar o isolamento de Maduro, em poucos dias Donald Trump retomará o governo dos EUA —desde seu primeiro mandato, o republicano não reconhecia o ditador como presidente. A dúvida é se pode haver alguma negociação envolvendo a deportação de venezuelanos.
Resta ao regime o apoio de Rússia, China, Turquia, Irã e outros países do eixo antiocidental, incluindo as ditaduras alinhadas em Cuba e Nicarágua. No Brasil, a despeito do atrito com Lula, permanece o aplauso do PT e de entidades diversas de esquerda. Não deixa de ser espantoso para quem solapou a democracia e fez da Venezuela o país mais pobre da América do Sul.
Deixe um comentário