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Coronelismo, enxada e Facebook – 01/03/2025 – Opinião


A aproximação de Mark Zuckerberg com Donald Trump causou frisson no início de janeiro. Um grande número de analistas veio a público chamar a atenção para os perigos dessa “guinada”.

Ao enfraquecer mecanismos de moderação de conteúdo que combatiam discursos de ódio e ao desmantelar as políticas de diversidade e equidade da Meta, Zuckerberg teria mostrado suas efetivas inclinações políticas, entrando de cabeça na empreitada autoritária de Donald Trump. Mais que isso, Zuckerberg afirma que trabalhará junto ao governo Trump para combater quaisquer tentativas de regulação do seu negócio, em suposta defesa da “liberdade de expressão”.

Com razão, a maior parte das pessoas que buscaram analisar o caso ressaltou o perigo da associação explícita do poderio econômico e da capacidade de influência comportamental da Meta com o poder político, bélico, econômico e ideológico do governo mais poderoso do mundo, sobretudo em um contexto em que não parece haver freios institucionais ao presidente dos EUA. Estaríamos vendo, com clareza e eloquência, um superpoder, que seguimos testemunhando neste início de governo Trump.

Quero argumentar, contudo, que existe outra face a ser observada neste caso todo. Zuckerberg explicita não apenas seu superpoder, mas também sua fraqueza neste movimento. Fica fácil entender isso se lembrarmos de Victor Nunes Leal na clássica obra “Coronelismo, Enxada e Voto”, publicada no final dos anos 1940. No livro, Leal se opõe às interpretações que explicam o coronelismo pela força dos coronéis no Brasil. Ele mostra a fraqueza dos coronéis, que precisavam se associar aos governadores para trocar o recurso sobre o qual tinham controle (i.e. o voto) para acessar os recursos de que necessitavam (o erário público para suas obras e favores). Ao expor a fraqueza dos coronéis, Victor Nunes Leal evidencia a rede de reciprocidades que permitiam a sobrevivência do coronelismo, ressaltando a impossibilidade de os coronéis confrontarem os governadores, de que dependiam.

Como um coronel da atualidade, Zuckerberg é didático e explícito: “Vamos trabalhar com o presidente Trump para reagir contra governos ao redor do mundo […] A única maneira de reagirmos contra essa tendência global é com o apoio do governo dos EUA”.

Sua fala mostra sua fragilidade. Ela evidencia a dependência e a impossibilidade de a Meta, com todo seu poder, perseguir seus objetivos sem o apoio da Presidência dos EUA. Ao fazê-lo, Zuckerberg mostra que é a política que pode impor limites e oferecer contrapesos a um superpoder, que muitos consideram inabalável. Zuckerberg tem medo de regulação das plataformas. Querendo mostrar força, o bilionário telegrafou aquilo que pode enfraquecê-lo.

É de regulação democrática que ele, e as plataformas em geral, têm medo. É ela que pode interromper o mandonismo desenfreado que afeta a soberania de outras nações e as ameaças cuspidas aos quatro ventos, tal como no mandonismo coronelista. E é por isso que, mais do que nunca, precisamos discutir politicamente a regulação de plataformas no Brasil.

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Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.



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