A primeira negociação direta entre Rússia e Ucrânia em três anos sobre o maior conflito europeu desde a Segunda Guerra Mundial durou cerca de 90 minutos nesta sexta-feira em Istambul, na Turquia. Fontes diplomáticas confirmaram que as partes chegaram a um acordo para uma troca envolvendo dois mil prisioneiros de guerra — mil de cada lado — que, se efetuada, será a maior entre as várias realizadas desde o começo do conflito. Uma nova rodada de diálogo ainda pode ser realizada antes do fim do dia, embora não houvesse nada agendado previamente.
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O anúncio sobre a troca de prisioneiros foi feito separadamente pelos chefes de cada delegação — de um lado, o ministro da Defesa ucraniano, Rustem Umerov, e do outro o assessor da Presidência russa, Vladimir Medinsky. Cada lado libertará mil prisioneiros “nos próximos dias”. Não foi confirmada uma data específica até o momento.
Trocas de prisioneiros não são uma novidade na dinâmica da guerra do Leste Europeu. Ao longo dos últimos três anos, várias foram realizadas, normalmente envolvendo algumas dezenas ou poucas centenas de cativos por vez. A libertação de mil prisioneiros em uma única troca seria inédita.
Em um comunicado, Medinsky afirmou que três pontos foram acordados na reunião. Além da troca de prisioneiros, o representante russo disse que a delegação enviada pelo Kremlin tomou em conta o pedido ucraniano para uma reunião direta entre os presidentes Volodymyr Zelensky, da Ucrânia, e Vladimir Putin, da Rússia — sem antecipar se isso ocorreria ou não — e que as visões sobre o fim do conflito serão colocadas a termo pelos dois lados.
“Concordamos que cada lado apresentará sua visão de um possível cessar-fogo futuro, detalhando-a por escrito. Uma vez apresentadas essas visões, acreditamos ser apropriado — como também foi acordado — continuar nossas negociações”, explicou o russo em um comunicado.
Em breve declaração a jornalistas, Umerov disse a jornalistas que o passo seguinte do encontro em Istambul deveria ser “organizar uma reunião ao nível dos dirigentes”.
O encontro mediado pela Turquia aconteceu no Palácio Dolmabahçe, construção histórica do Império Otomano às margens do Bósforo. Fontes diplomáticas ucranianas ouvidas sob sigilo por agências internacionais revelaram um pouco das questões levantadas durante o encontro, incluindo a tentativa de Kiev de fechar um compromisso para o encontro entre os presidentes.
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Uma fonte ucraniana ouvida pela agência de notícias francesa AFP afirmou que os representantes russos apresentaram como condição para um cessar-fogo que a Ucrânia retirasse suas tropas de parte do território em disputa, termo apontado por Kiev como uma tentativa de inviabilizar as tratativas.
— Representantes russos estão apresentando exigências inaceitáveis… como a retirada de forças da Ucrânia de grande parte do território ucraniano que controla para que um cessar-fogo possa ser iniciado — disse.
Reunido com líderes europeus em Tirana (capital da Albânia), Zelensky pediu uma ação “forte” do Ocidente contra Moscou, incluindo novas sanções, caso as negociações de paz em Istambul não produzissem avanços. No dia anterior, ele criticou duramente Putin por não viajar para a Turquia para a reunião e chamou a delegação enviada por Moscou de “elenco de figuração“, questionando a capacidade dos representantes — a maioria, burocratas de segundo escalão — de tomar decisões durante as tratativas.
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— Tínhamos uma chance real de dar passos importantes para acabar com esta guerra, se Putin não tivesse tido medo de vir à Turquia — disse Zelensky. — Se a delegação russa for realmente apenas figuração e não conseguir apresentar nenhum resultado hoje… é necessária uma reação forte, incluindo sanções contra o setor energético e os bancos russos — falou na quinta-feira.
A imposição de novas sanções é algo que divide os aliados da Otan dos dois lados do Atlântico. Os EUA têm defendido uma abordagem menos dura — em alguns momentos vista como simpática — a Moscou, alegando que é a única forma de avançar para um diálogo. Os países europeus defendem fazer um jogo duro contra a Rússia, aumentando a pressão para forçar o fim da guerra.
Tanto Zelensky quanto os aliados europeus conversaram com Trump por telefone nesta sexta, quando o líder ucraniano se disse disposto a tomar as medidas “mais rápidas possíveis” para alcançar a paz, mas defendendo o aumento da pressão sobre a Rússia. Alguns líderes europeus também defenderam a abordagem nesta sexta.
Em um comunicado conjunto, o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, o presidente francês, Emmanuel Macron, o chanceler alemão, Friedrich Merz, e o líder polonês, Donald Tusk, afirmaram que “a posição russa é claramente inaceitável, e não pela primeira vez”.
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Os quatro, que estiveram reunidos com Zelensky em Kiev na semana passada e tentaram pressionar Putin a viajar para as tratativas na Turquia, também participaram da ligação com Trump.
— Como resultado dessa reunião com o presidente Zelensky e da discussão com o presidente Trump, estamos agora alinhando e coordenando estreitamente nossas respostas e continuaremos a fazê-lo — disse Starmer, citado pela Reuters.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, prometeu “aumentar a pressão até que o presidente Putin esteja pronto para a paz”, afirmando que um novo pacote de sanções já estava em negociação.
Em uma breve mudança de tom, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, afirmou antes do encontro entre Kiev e Moscou que a Rússia deve interromper o “massacre” contra a Ucrânia. A declaração, feita em Istambul em um encontro com representantes diplomáticos turcos e ucranianos, aconteceu nesta sexta-feira, pouco antes do início das tratativas.
O comentário de Rubio foi destacado pela porta-voz do Departamento de Estado americano, Tammy Bruce, que afirmou que o chefe da diplomacia americana apenas “reiterou a posição dos EUA de que é necessário pôr fim ao massacre”. Washington não se posicionou na semana passada, quando a Ucrânia e aliados europeus pressionaram a Rússia a concordar com um cessar-fogo incondicional de 30 dias e abrir negociações de paz.
Apesar do marco de primeiro contato diplomático direto desde 2022, a expectativa de que a negociação produzisse resultados significativos era baixa — o próprio presidente dos EUA, Donald Trump, afirmou que qualquer avanço só aconteceria quando ele e o líder russo, Vladimir Putin, se encontrassem. Cumprindo sua primeira agenda externa em viagem ao Oriente Médio, Trump disse na quinta-feira que Putin não viajou à Turquia porque sabia que ele não estaria também presente. Ele também disse que nada iria acontecer em sua ausência. Nesta sexta, porém, afirmou que pretende se encontrar com o homólogo “assim que possível”.
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— Assim que conseguirmos organizar, eu sairia daqui e iria — disse Trump em resposta a uma pergunta sobre uma possível reunião com o presidente russo.
Em Moscou, o Kremlin fez um aceno para a participação do líder russo em negociações, mas com o presidente americano, Donald Trump.
— Os contatos entre os presidentes Putin e Trump são extremamente importantes no contexto do acordo ucraniano — afirmou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, acrescentando que “um encontro é sem dúvida necessário”. (Com AFP e NYT)
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