Inútil como forma de pressão sobre o Supremo Tribunal Federal, prestes a tornar Jair Bolsonaro réu por tentativa de golpe de Estado, o ato esvaziado de seus apoiadores em Copacabana neste domingo (16) teve serventia diversa para o grupo atrelado ao ex-presidente.
Destacou-se Tarcísio de Freitas, o governador paulista pelo Republicanos que encabeça a bolsa de apostas para ocupar a posição de desafiante do petismo em 2026. Em cima do trio elétrico, ele buscou o jogo impossível de ser bolsonarista e moderado ao mesmo tempo.
Tarcísio envergava uma camisa da CBF, mas do uniforme número 2 da seleção, azul. De forma simbólica, apresentou-se como igual, mas diferente dos pares mais radicalizados no palco.
Elencou itens de discurso de candidato a presidente. “Ninguém aguenta mais a inflação”, disse, sem esquecer do preço do ovo, o vilão da vez. Foi no pescoço do presidente Lula (PT): “Os que assaltaram a Petrobras voltaram à cena do crime”.
O governador foi bem mais comedido, contudo, na hora de criticar o Supremo Tribunal Federal, alvo de todos os outros oradores. O senador Flávio Bolsonaro (PL), por exemplo, acusou Alexandre de Moraes de ter matado “de forma deliberada” Cleriston Pereira da Cunha, o detido no 8 de Janeiro que morreu na cadeia.
Isso para não falar na pregação do pastor Silas Malafaia, organizador do evento, pálido em relação aos três outros promovidos para tentar intimidar o Judiciário e defender a figura de Bolsonaro.
Tarcísio discursou genericamente na defesa da liberdade, mas não atacou a pessoa física. Preferiu falar em “quem criou o Pix” e que “nós vamos libertar o Brasil da esquerda”.
Por fim, o governador beijou a cruz, como não seria diferente. “Querem afastar Jair Messias Bolsonaro das urnas. Eles têm medo de perder”, disse, deixando o sujeito oculto —o “eles” no ideário bolsonarista é um misto de Lula e Moraes.
Em troca, ganhou uma referência rápida no discurso do ex-presidente, que comparava ministros de seu governo e do atual, além de uma frase mais genérica em que Bolsonaro admitia estar perto do “fim do ciclo”, mas que havia “deixado pessoas” capazes de substituí-lo.
Como se sabe, Tarcísio precisa mostrar-se palatável para a grande franja do eleitorado que rejeita Bolsonaro sem necessariamente apoiar Lula —aqueles que votaram no petista, dando-lhe a exígua vitória de 2022, e que hoje ajudam a colocar o petista no pior patamar de popularidade de sua história como presidente.
Ao mesmo tempo, não pode insinuar nada que seja lido como traição. Daí a profusão de “viva Bolsonaro” e odes à improvável volta do antecessor de Lula ao rol de políticos elegíveis. A anistia ao ex-mandatário pode até avançar no Congresso, disfarçada de simpatia humanitária aos condenados do 8 de Janeiro, mas enfrentará o “firewall” do Judiciário à frente.
Se o governador de São Paulo trabalha de olho no futuro político, Bolsonaro em seu discurso previsível demonstrou o foco total na própria liberdade. O ex-presidente não esconde o temor de ser preso.
“Se algo na covardia acontecer comigo, continue lutando”, disse. “Eu vou ser um problema para eles, preso ou morto”, afirmou, voltando ao “eles”, uma formulação de resto usada à exaustão por Lula ao longo de sua carreira
Segundo seu entorno, Bolsonaro acredita de fato na anistia e na volta por cima no ano que vem, inspirado pelo exemplo de seu ídolo Donald Trump —o americano estava presente na forma de um cartaz aludindo ao “lute, lute, lute” gritado por ele após o atentado na campanha do ano passado.
Pode ser, mas em público não transpareceu mais do que uma figura buscando a vitimização, comparando-se a mulheres idosas condenadas por Moraes. “Inventam uma historinha de golpe”, discursou.
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