Cartagena, na Colômbia, sediou de 17 a 19 de março o 8º Congresso de Editores da União Europeia, da América Latina e do Caribe. O evento reuniu jornalistas de veículos de 17 países –a única empresa brasileira de comunicação com representante era a Folha –, políticos colombianos e executivos de empresas.
Os dois principais eixos de debate foram o impacto da inteligência artificial no jornalismo e as relações econômicas entre a América Latina e a Europa.
A declaração final do congresso pediu que o desenvolvimento da inteligência artificial respeite os direitos autorais do jornalismo.
“Propomos implementar medidas para proteger os conteúdos de notícias digitais publicados recentemente para que não sejam utilizados com fins de formação e contribuição de IA generativa durante um período definido (48 horas) após sua publicação inicial”, diz o texto.
O documento demanda ainda que profissionais da área tenham sua atuação protegida de ameaças à liberdade de expressão.
Leia abaixo a íntegra da conclusão do evento
Declaração de Cartagena das Índias
Congresso de Editores da União Europeia, da América Latina e do Caribe
Cartagena das Índias, 19 de março de 2025
O 8º Congresso de Editores da União Europeia, da América Latina e do Caribe constata uma época de profunda transformação e uma revolução cultural, social e econômica, de consequências imprevisíveis, que exige uma atitude atenta e flexível por parte dos meios de comunicação.
– Reafirmamos que a informação é um direito inalienável de todas as pessoas, um instrumento imprescindível para assegurar a democracia e, com ela, a liberdade, a igualdade, a cultura, as ciências, a convivência pacífica e o desenvolvimento. É essencial na denúncia da violência, das guerras, das invasões, dos poderes causadores de perseguição ideológica, das ditaduras em geral, e das máfias e do terrorismo em particular, assim como na defesa contra as pressões dos atores da economia que, com seu poder, condicionam conteúdos jornalísticos.
– Os congressistas solicitam a proteção dos jornalistas no exercício de sua profissão para garantir o direito à informação responsável dos cidadãos, longe dos discursos de ódio e discriminação. Em um mundo global, acentua-se o valor do papel do jornalista como o profissional mais apto para canalizar a informação, submetido a seus exigentes códigos deontológicos e ao compromisso social com o bem comum. Entre tantos desafios e mudanças apaixonantes, o jornalismo deve continuar desempenhando seu papel essencial como referência, como legatário dos valores fundamentais refletidos na Declaração dos Direitos dos seres humanos, e que em sua honestidade intelectual deve proteger suas fontes, não tolerar censuras, nem ceder a pressões, sejam de que natureza forem. Deve guiar o trabalho do jornalista, inquirir, perseguir, fiscalizar todo poder e buscar a clareza em sua exposição.
– Os reunidos mostram sua total solidariedade com cada cidadão afetado pelos abusos de poder e muito especialmente com os colegas e meios que realizam seu trabalho nos locais de conflito. Também apoiam todos os jornalistas e técnicos que oferecem sua vida pela verdade, ou são vítimas de censura, perseguição, ameaças ou prisão por parte dos poderes.
– É preciso responder com competência ao previsível avanço exponencial de tecnologias como a chamada Inteligência Artificial – é necessário promover regulamentações mais rigorosas em áreas como as relativas aos deepfakes (uso de imagem, vídeo e áudio de brincadeira midiática) e aos algoritmos de recomendação, assim como o respeito aos direitos autorais – e à irrupção, em paralelo, dos macropoderes econômicos supranacionais. Esta seção alude a todos os sistemas de suporte técnico por vir.
– Propomos implementar medidas para proteger os conteúdos de notícias digitais publicados recentemente para que não sejam utilizados com fins de formação e contribuição de IA generativa durante um período definido (48 horas) após sua publicação inicial.
– Exigimos conceder aos titulares de direitos a remuneração adequada dos provedores de IA generativa pelo uso de seu conteúdo.
– Deve-se transferir o ônus da prova para os provedores de IA para demonstrar o uso legal dos conteúdos.
– Solicitamos renovar as permissões legais para que os provedores de IA generativa utilizem o conteúdo do site com fins de mineração de textos e dados, garantindo mecanismos de exclusão voluntária exigíveis sem afetar a indexação dos motores de busca.
– Os provedores de IA devem ser considerados responsáveis por sua produção.
– Reivindicamos a necessidade de sistemas de “fact check” para a verificação das fontes como garantia básica para o exercício do direito à informação.
– Os editores reconhecem o papel fundamental da formação e preparação dos jornalistas no uso ético e responsável da IA.
– Exigimos a aplicação da mesma legislação penal dos delitos de opinião às plataformas de Redes Sociais, pois exercem a mesma responsabilidade social que os meios de comunicação.
– Comprometemo-nos a denunciar toda interferência dos legisladores nacionais e dos organismos supranacionais na autonomia editorial que coloque em risco a independência e a diversidade da informação. O direito de definir, manter, mudar e realizar a tendência de uma publicação é uma consequência da liberdade de imprensa protegida.
– Comprometemo-nos a controlar a alocação transparente da publicidade estatal, que não deve ser utilizada em função de preferências políticas, mas, acima de tudo, com base em normas profissionais reconhecidas de alcance imparcial do público-alvo.
– Estamos cientes de que devemos nos reposicionar como indústria e como profissão. Devemos encontrar os meios para obter recursos transparentes e suficientes para nos sustentar, para suportar a tecnificação imprescindível, para pagar as investigações ou para assegurar nossa defesa nos Tribunais diante de ataques injustos.
– Devemos responder à verdade com mais e melhor jornalismo. Devemos responder com meios livres, com iniciativas como EDITORED, essa cola de apoio e liberdade que nos une indefectivelmente em um compromisso de apoio e unidade de ação.
– Reconhecemos a necessidade de contar com as autoridades, com o desenvolvimento de regulamentações não impositivas; o fomento de associações e acordos profissionais participativos; de empresas justas que impulsionem a economia circular, o respeito ao meio ambiente e, muito fundamentalmente, o compromisso com a igualdade de gênero; devemos ajudar os empreendedores, as novas gerações de informadores, os marginalizados sociais, os mais fracos.
– Mais do que nunca, cabe-nos exercer nosso papel diante de governos que pressupõem em uma mistura de populismo, xenofobia e pensamento mágico, os antidemocráticos ou extremistas. Em um contexto euro-americano, cabe-nos atender de maneira muito especial à mudança nas relações internacionais, valorizando a civilização ocidental que representam a União Europeia e a América Latina Caribe na defesa dos direitos humanos e da democracia. Esta declaração de Cartagena das Índias sublinha a necessidade de uma resposta proativa e colaborativa diante dos desafios do ambiente global atual. Nas sete edições anteriores do Congresso, investimos nossos principais esforços em um programa disposto ao avanço moral e social, rumo a um liberalismo compreensível, compartilhável, esse deve continuar sendo nosso propósito, pois isso nos tornará mais livres. Os jornalistas estamos em uma única guerra, a da verdade, lutamos pela decência e pela democracia, e a única resposta adequada é sermos mais fortes a cada dia em nosso trabalho, devemos por isso nos opor à intolerância e ao ódio, e permanecer firmes contra a violência, a repressão e o abuso de poder. Nossas armas são as palavras, nossas culturas locais nosso maior tesouro. Muito singularmente, comprometemo-nos a defender o idioma castelhano ou espanhol, também o português, pois os meios de comunicação são os principais canais de sua difusão e promoção em todo o mundo. Por isso, nos obrigamos a zelar pela correção e bom uso de ambas as línguas, de suas diversas variedades dialetais e do restante das línguas ibero-americanas, favorecendo sua acessibilidade e propiciando que se tornem uma ferramenta fundamental para combater a desinformação. Idealismo, compromisso, determinação e coragem são nossa principal estratégia e juntos nos sentimos mais fortes para defendê-la.
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