Um vídeo de apenas 14 segundos, publicado na véspera da estreia de Novak Djokovic no Masters 1000 de Miami, no último dia 20, ajudou a alimentar rumores sobre um possível fim de carreira do maior vencedor de Grand Slams da história.
No conteúdo viral no X (antigo Twitter), o experiente tenista sérvio, 37, gesticula e desabafa durante um treinamento com clara insatisfação sobre o próprio desempenho em direção a um integrante de sua equipe.
“Nesses dias, só bons serviços estão me salvando. Apenas um bom saque me salva para me manter no rally “, disse, encerrando a atividade em sequência.
Menos de 24 horas depois, Djoko entrava na principal quadra do complexo do Hard Rock Stadium, onde ocorre o torneio, para uma vitória por 2 sets a 0 sobre o australiano Rinky Hijikata, aplicando um pneu —termo usado no tênis quando um o set termina em 6 games a 0—, além de nove aces contra dois do adversário.
Neste domingo (30), ele faz a final do torneio contra o tcheco Jakub Mensik (atual número 54 do ranking da ATP) podendo conquistar o 100º título de simples da carreira de ânimo renovado. Ele é o mais velho a chegar na decisão de um torneio desse porte.
“Nunca pode haver dúvidas quando se trata de Novak. Estamos falando do jogador com melhor desempenho na história e, sempre que tem uma raquete em mãos, se transforma em um competidor com uma força que nunca vi em outro”, analisa à Folha o ex-tenista alemão Tommy Haas, número 2 do mundo em 2002.
“Julgam o último ano dele como ruim, mas, quando se olha friamente, tenho certeza que 99% dos jogadores adorariam uma temporada assim”, completa.
A temporada citada por Haas foi marcada pela conquista do ouro olímpico nos Jogos de Paris, além de dois vices, em Wimbledon e no Masters 1000 de Xangai, diante do espanhol Carlos Alcaraz (3º) e do italiano Jack Sinner (1º), respectivamente.
Djokovic chegou a Miami sob olhares desconfiados, apesar do currículo inquestionável, já que havia sido derrotado logo nas estreias do ATP 500 de Doha e no Masters 1000 de Indian Wells, na Califórnia.
No último, acabou surpreendido pelo holandês Botic Van de Zandschulp, um “lucky loser” (perdedor de sorte, em tradução livre do inglês). O termo é usado quando um tenista perde no qualifying e só segue no torneio por conta de desistência.
“Não há declínio técnico ou físico, mas é mais normal agora para um cara como ele, por tudo o que já fez, jogar um ou dois meses mal, fazer treinos ruins. Isso é parte do tênis, mas como sempre foi acima da curva, é menos corriqueiro. A Iga Swiatek (atual número 2 no ranking da WTA) não ganhou nenhum torneio esse ano ainda”, pondera o tenista Marcelo Melo, 41, ex-número 1 em duplas.
A relação com o público, o torneio e a cidade ao sul da Flórida parecem ter feito bem ao jogador. É cena comum distribuir sorrisos aos torcedores no final das partidas. Ao final da vitória contra Camilo Ugo Carabelli comemorou simulando tocar violino com a raquete.
Em janeiro, no Australian Open, por várias vezes fechou o semblante e demonstrou irritação com as vaias e manifestações do público. Trocou provocações e, por fim, precisou mostrar a imagem de um exame nas redes sociais para provar que a desistência na semifinal foi provocada por uma lesão.
“Ele sempre soube canalizar pressões para o lado positivo. A final de Wimbledon com o Federer com o estádio todo torcendo contra, por exemplo, o fez mais forte. Esse modus operandi é típico dele, enquanto o mais natural seria mandar todo mundo para aquele lugar”, explica Ricardo Acioly, ex-técnico de Fernando Meligeni e do Brasil na Copa Davis.
“Mas é raro um tenista desse nível dizer que acabou. Ele vai tentar se reinventar até não conseguir mais, a chegada do Andy Murray foi para isso”, completa Pardal, lembrando de episódios como quando o próprio Murray testou uma mudança de raquetes antes da aposentadoria, trocando o modelo da Head pela marca japonesa Yonex.
Essa será a primeira final desde a parceria anunciada em novembro. Depois de anos de rivalidade, o britânico bicampeão olímpico assumiu como seu treinador a partir do Aberto da Austrália.
“A figura do Murray é algo importante, vai além da contratação de um coach. É alguém que ele pode ouvir e respeitar. Talvez não jogue mais 100%, chegue a 70%… 80%, o suficiente para ganhar um Grand Slam? É isso que está descobrindo. O ponto principal é: nunca aposte contra Djokovic, não é uma boa ideia”, explica o ex-tenista Bruno Soares.
“É muito legal ver que a chama ainda está acesa. A insatisfação dele no treino e tudo o que faz mostra como quer melhorar mesmo quebrando todos os recordes, mesmo que seja 1%. Por isso é tão admirado. Claro que há um declínio físico, mas ele continua porque sabe que ainda pode fazer coisas”, conta o tenista Marcelo Demoliner.
Em 2017, Djokovic deixou após eliminação em Roland Garros o top 3 pela primeira vez depois de oito anos repleto de questionamentos. Em maio de 2018, chegou a ocupar a 21ª posição, mas deu a volta por cima e terminou no topo.
Mais velho jogador a chegar a uma final de um Masters 1000, sem perder um set até aqui no torneio, não faltam indicativos de um novo ressurgimento do fenômeno.
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