Sete pesquisadores da Índia dividem o navio Akademik Tryoshnikov, circum-navegando a Antártida, com cientistas de outras seis nacionalidades. Entre as diferentes culturas, a forma de comunicação mais lógica —ao menos no momento histórico atual— é o inglês. E é também o inglês a língua possível para comunicação entre os próprios cientistas indianos, que falam diferentes idiomas, apesar de viverem no mesmo país.
“Nós já estamos familiarizados com isso”, diz Shramik Patil, 40, chefe da delegação indiana da expedição antártica liderada pelo Brasil. “Todo mundo na Índia fala pelo menos 3 a 4 idiomas.”
A enorme diversidade cultural indiana fica mais clara nas 22 línguas reconhecidas pela Constituição do país. Já as línguas oficiais são o hindi e o inglês, como destaca Patil. “Trabalhamos em ambas as línguas, mas nem todos falam hindi”, afirma o pesquisador.
O líder dos indianos na expedição faz parte do NCPOR (Centro Nacional de Pesquisa Polar e Oceânica), localizado em Goa, estado indiano que já esteve sob posse de Portugal —até meados do século passado.
O veterano antártico diz que a estação científica indiana de Maitri —após mais de três décadas, prestes a ser aposentada pela Maitri-2— pela qual a expedição atual passou, traz a sensação de lar.
Patil conta, no Diário da Antártida desta semana, sobre sua pesquisa com cocolitóforos —ou, numa “língua” talvez mais acessível a todos, mais conhecidos como nanoplâncton.
A primeira vez que vim à Antártida foi realmente incrível porque foi na época em que estávamos construindo nossa base de pesquisa indiana Bharati. Vi como as pessoas trabalham para construir uma estação na Antártida e como conseguimos completar a construção da estação inteira em quatro meses. Foi realmente empolgante ver isso. Ao mesmo tempo, estávamos envolvidos em algumas atividades de pesquisa, coletando as amostras abaixo do gelo antártico.
E, quando eu estava aqui na última vez, em fevereiro passado, estávamos testando alguns novos equipamentos. Todo ano, tenho uma experiência diferente. Todo ano, tento implementar o conhecimento que adquiri nas expedições anteriores e aprender algo novo.
Fiz parte de quatro expedições antárticas. Se pensarmos 60° ao sul [de latitude], eu já estive em dez expedições. Participei de dez expedições nos meus 16 anos de carreira de pesquisa.
Esta [a expedição atual] é uma experiência completamente diferente. Nas anteriores, algumas de nossas amostras estavam restritas a uma região geográfica. Há poucas pessoas no mundo que circum-navegaram a Antártida para coletar amostras. O que alcançamos é realmente incrível, porque eu não poderia imaginar coletar tantas amostras de diferentes regiões geográficas.
Um momento memorável foi quando estávamos perto da costa, quando deveríamos fazer algumas operações em terra. O navio estava ancorado muito perto da costa e podíamos ver algumas paisagens lindas. Especificamente, vimos pela primeira vez o vulcão ativo [o monte Erebus]. Não é como se estivesse em erupção, ele está dormente, mas é considerado um vulcão ativo no mar de Ross. É bastante incrível ver com meus próprios olhos o vulcão e uma montanha tão alta e enorme.
Das outras expedições, lembro uma em especial: a expedição paleogeográfica do arquipélago Crozet, em 2019. Pela primeira vez, coletamos uma amostra de sedimento que tinha 70 metros de comprimento [basicamente, um testemunho, uma grande amostra cilíndrica retirada de algum lugar]. Foi um momento de muito aprendizado, para ver como uma grande amostra de sedimento era coletada do oceano. E havia também pessoas de seis ou sete países diferentes. Estávamos trabalhando juntos, cortando a amostra, fatiando, fazendo as descrições, realizando as análises primárias. Essa é uma das expedições de que realmente sinto falta.
Sou um oceanógrafo biológico, mas também trabalho com sedimentos e faço alguns estudos com culturas de organismos. Tenho mestrado em biologia marinha e doutorado em ciências marinhas.
Trabalhei com fitoplâncton calcificante marinho chamado cocolitóforos, que são altamente dominantes no oceano Austral. Para esta expedição estou trabalhando com nanoplâncton fracamente calcificado e silicificado.
O nanoplâncton calcário inclui cocolitóforos bem mineralizados e várias outras espécies fracamente calcificadas. Normalmente chamamos os cocolitóforos de nanoplâncton.
Existem várias espécies de cocolitóforos (fitoplâncton calcificante) e espécies fracamente calcificadas (por exemplo, Petasaria heterolepis, Prymnesium neolepis) que formam estruturas fracamente calcificadas ou silicificadas e que são altamente abundantes nas águas mais frias do sul. São organismos muito pequenos, com tamanho inferior a dez micrômetros, cinco micrômetros, que estão projetados para serem afetados por mudanças climáticas, à medida que a temperatura e o CO2 aumentam. Estou estudando como essas espécies estão respondendo.
Para mim, a coleta de amostras é bastante fácil [na expedição]. Apenas coleto água e filtro a partir de 40 mícrons para eliminar organismos maiores. Tenho um frasco onde coloco o papel de filtro e despejo a água lentamente. Quando seca, eu coleto o papel de filtro e coloco em uma placa de Petri. Esse é o trabalho mais simples que tenho a bordo.
Mas, depois de voltar, é quando o maior desafio começa, onde preciso trabalhar com o microscópio eletrônico. Uma amostra leva de 2 a 3 dias para analisar. Às vezes, encontro novas espécies, não descritas. Então, eu tenho que me sentar e descrever. Leva tempo para descrever espécies.
Aqui eu tenho as amostras de uma vida, pelo tanto de material que posso obter. Eu acabei de coletar a 75ª amostra da superfície e já coletamos 70 perfis [de água]. Tenho mais de 150 amostras desta expedição.
Somos em sete pessoas [da Índia].
Sudarsana Rao Pandi, que é o segundo mais experiente, está trabalhando nas propriedades bio-ópticas. Ele estuda a clorofila e os pigmentos do fitoplâncton oceânico.
A Melena Soares está trabalhando na química da água. Ela trabalha com os nutrientes, o pH e o orçamento de carbono do oceano.
Sharmila Sherin é geóloga e está coletando amostras de isótopos de oxigênio e amostras de sedimento.
Jeebanjyoti Swain está trabalhando nas polínias na Antártida, como elas desempenham um papel importante na produção do fitoplâncton marinho.
Ghulam Rabbani trabalha nos traços de metais na coluna d’água.
E Aanchal Chauhan, com microplásticos e bactérias associadas aos microplásticos.
Melena Soares, como você pode ver, tem um sobrenome português. Ela estava nos contando que vê seus pais falando português. Eu não nasci e cresci em Goa, mas estou morando lá há 16, 17 anos. Mas eu posso falar a língua local. Há alguma influência do português na língua de Goa e, da mesma forma, algumas palavras de Goa usadas no português de Portugal.
Falamos inglês com todos [da expedição]. Há pessoas que não falam inglês, mas usamos o Google Tradutor para interagir. E, por falar em idiomas, devo mencionar que os sete da Índia vieram de diferentes estados e cada um fala línguas diferentes. Então, falamos em inglês.
Eu vim de um estado chamado Maharashtra, falamos marathi. Melena veio de Goa e fala konkani. Sudarsana veio de Andhra Pradesh, então ele fala telugu. Rabbani fala urdu em casa. Jeebanjyoti é de Odisha e fala odia. E Aanchal, seus pais eram do Haryana e ela fala haryanvi [que não faz parte das línguas reconhecidas na constituição indiana].
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