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Livro de Juliana Dal Piva destrincha caso Rubens Paiva – 15/02/2025 – Poder

O ex-deputado federal Rubens Paiva estava com a família em casa, na zona sul carioca, quando foi preso pelo regime militar, em 1971.

Apesar de emblemático, seu desaparecimento não costumava ser o mais citado ao se falar sobre a repressão na ditadura no país —ao menos, isto é, até a estreia de “Ainda Estou Aqui“. O filme, que narra a luta da viúva do ex-congressista, Eunice, para esclarecer as circunstâncias de sua morte, tornou-se no ano passado o filme brasileiro de maior bilheteria do pós-pandemia e agora disputa a corrida pelo Oscar.

A jornalista e pesquisadora Juliana Dal Piva afirma que alguns fatores, porém, tornavam o caso de Rubens Paiva singular. Ele não integrava grupos armados; era um homem branco, de classe média alta, e suas ligações com a cúpula do poder no país devido à própria atuação como congressista amplificaram as tentativas de sua família de chamar a atenção para o seu caso.

Além disso, o momento de sua prisão foi testemunhado por diversas pessoas, diferentemente do que ocorria com a maioria dos desaparecimentos realizados pelo regime, sequestrados e mortos clandestinamente. Isso obrigou os militares a forjar documentos para encobrir o seu assassinato —documentos estes que mais tarde seriam fundamentais para apontar os envolvidos no crime.

É essa trilha de papel que Dal Piva, autora de “O Negócio do Jair”, segue em “Crime Sem Castigo”, livro que lança pela editora Matrix. “Ela me permitiu, de certa forma, montar esse quebra-cabeça de como se descobriu quem foram os assassinos de Rubens Paiva ao longo de 40 anos”, diz a jornalista, que partiu de seu projeto de mestrado, defendido quase uma década atrás, para compor o livro.

A obra percorre todos os procedimentos de apuração sobre o crime, desde a sindicância interna do Exército (1971), seguida pelo inquérito na Polícia Federal (1986), depois transformado em Inquérito Policial Militar (1987), passando pela pesquisa da Comissão Nacional da Verdade e da Comissão da Verdade do Rio (2012-2014) até as investigações do Ministério Público Federal (2012-2014).

Também destaca a contribuição da imprensa para o avanço das investigações ao mostrar como, apoiados por familiares das vítimas e da sociedade civil, jornalistas muitas vezes desempenharam papéis que deveriam caber ao poder público.

A autora defende que o caso ajuda a esclarecer alguns mitos sobre o período da ditadura. Ele desmontaria, por exemplo, as falsas noções de que as ações do regime eram uma resposta proporcional às ameaças dos dissidentes e que a sua violência era promovida por um seleto grupo de militares.

Afinal, afirma Dal Piva, um dos oficiais notificados sobre a morte do ex-deputado era um subordinado do Ministério do Exército. “O aparato violento da ditadura era de cima para baixo”, diz.

Ele partia da cúpula do regime e era conhecido pelos generais que ocuparam a Presidência da República. Militares, inclusive os de baixa patente, eram treinados para se tornar torturadores “com dinheiro do contribuinte brasileiro”, nas palavras dela.

A jornalista acrescenta que outro dos motivos que tornam a jornada de busca pela responsabilização dos assassinos de Paiva na Justiça tão relevante diz respeito a uma discussão legal que ele ajudou a abrir. Um recurso sobre o caso encaminhado para o Supremo Tribunal Federal (STF) em 2021 e atualmente no gabinete do ministro Alexandre de Moraes que desafia o atual entendimento da Lei de Anistia no país reforçou a necessidade de uma discussão sobre crimes contra a humanidade no país, segundo Dal Piva.

“Do jeito que a Lei de Anistia é interpretada hoje, ela é um cheque em branco. Não sabemos que crimes foram cometidos, quem os cometeu. Não se permite uma investigação para que, uma vez que os fatos estejam esclarecidos, eles sejam discutidos”, diz ela. “E isso seria uma porta de entrada para os demais casos.”

Dal Piva já se dedicou a apurar várias dessas histórias. Um de seus principais projetos de pesquisa versa sobre a Casa da Morte em Petrópolis (RJ), que funcionou como um centro de tortura durante o regime. Ela prepara, ao lado de Chico Otavio, ex-colega do jornal O Globo, um livro sobre o tema, este a ser publicado pela Companhia das Letras.

“O ideal é que não se pare no filme. Que aproveitemos esse momento para abrir caminho para falar dos outros”, diz a jornalista. Sobretudo, ela acrescenta, em um momento histórico como o que se vive no Brasil, em que se discute o envolvimento dos militares na tentativa de golpe de 8 de janeiro. “A maneira como o Brasil enfrentou a sua transição para a democracia foi incompleta, sem mexer nas estruturas. Isso tem consequências.”

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