Depois da crise bancária do final do século passado, o Brasil pareceu ter dado um salto na direção da racionalidade do capitalismo financeiro. Pedro Malan, Gustavo Franco e Armínio Fraga arrumaram o Banco Central e, sob o comando de Fernando Henrique Cardoso, limparam boa parte do mercado. Foram à garra bancos de ex-ministros (Econômico e Bamerindus) e até mesmo o Nacional, pertencente à família da nora de FHC.
Em 1995 criou-se o Fundo Garantidor de Créditos, uma entidade privada que garantiria investimentos financeiros. Hoje, o FGC garante papéis até o valor de R$ 250 mil.
Passou o tempo e o pesadelo voltou. Com jeito de quem não queria nada, anunciou-se numa sexta-feira que o Banco Regional de Brasília, BRB, instituição do Governo do Distrito Federal, comprará por R$ 2 bilhões uma fatia do Master. O controlador do Master, Daniel Vorcaro, continuará na cadeira e presidirá o conselho de administração da nova instituição.
Sabia-se há mais de um ano que o Master pagava comissões exorbitantes e oferecia remunerações muito superiores às do mercado. Como contrapartida, patrocinava magníficos ágapes e recrutava conselheiros ilustres e “consultores estratégicos”.
Os sinais de alerta acenderam-se durante o mandato de Roberto Campos Neto, mas os mecanismos deixados pela trinca Malan-Franco-Fraga estavam desligados e a encrenca acabou na mesa de Gabriel Galípolo.
Restava a válvula do Fundo Garantidor. Se tudo desse errado, a conta do Master iria para a própria banca. Ilusão democrática (vale lembrar que esse fundo não é alimentado pelo patrimônio dos bancos privados. Seu ervanário vem de taxas cobradas aos clientes).
A astuciosa engenharia da entrada do BRB no tango tirará as contas do Master do colo do fundo dos banqueiros, levando-as para o colo da Viúva, já que ele é estatal. Triste sina a dos clientes dos bancos. Na ida, sustentam o Fundo Garantidor da banca, na volta, pagam seus impostos à Viúva e, se as contas do Master azedarem, pagarão de novo.
As operações do esfuziante banco Master já azedaram em pelo menos duas ocasiões. No ano passado, ele esteve perto de vender R$ 500 milhões de papéis para a Caixa Econômica. Dois diretores condenaram a operação e foram demitidos. Meses depois, caiu o padrinho do negócio. Quando a operação atolou, o Master levou-a para o fundo de pensão dos servidores do Rio.
Banqueiros audaciosos gostam de Pindorama
Banqueiro audacioso faz negócios arriscados. Nos Estados Unidos, Amadeo Giannini tinha um pequeno banco em abril de 1906, quando um terremoto destruiu parte de Los Angeles. Ele foi ao cofre, botou seu dinheiro em carretas e emprestou a quem precisasse. Ele contava que recebeu tudo de volta, mas, em cima desse lance, Giannini criou o poderoso Bank of America.
No Brasil, banqueiros audaciosos fazem negócios com amigos e vendem papéis ora à Viúva, ora a fundos de pensão. O Master parece ter inovado: se os negócios azedarem, a Boa Senhora fica com a conta. Parece maldição.
Charles Ponzi, criador da célebre pirâmide dos anos 1920 nos Estados Unidos, foi apanhado e a Viúva tomou-lhe até a roupa do corpo. Ele passou 12 anos na cadeia, costurando cuecas. Solto, acabou em Pindorama, em 1939.
Ponzi morreu aos 67 anos em 1949 num hospital público do Rio. Ele vivia no Engenho Novo, com uma aposentadoria de 70 dólares mensais do fundo de pensão dos comerciários, cerca de R$ 5.000 em dinheiro de hoje.
Caberá ao Banco Central referendar a compra da fatia do Master pelo BRB. Numa primeira versão, ele teria um ano para decidir. Malan nasceu em Petrópolis e vive no Rio, Gustavo Franco e Armínio Fraga são cariocas. Como a velha guarda, inspiraram-se no enredo de um capitalismo financeiro, com um Banco Central musculoso. Desprezaram o verso do sambista:
Sonho de rei, de pirata e jardineira;
Pra tudo se acabar na quarta-feira.
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