Um movimento errado e buuum!!! Corpos rolam por todo lado… “Oh meu Deus! Não!”, grita exaltado o repórter de TV. Nas imagens vemos feridos ensanguentados no asfalto enquanto o pelotão avança ensandecido.
Parece cobertura de guerra ou catástrofe, mas é apenas uma corrida de bicicletas onde acidentes violentos, a mais de 80 km/h, foram normalizados e até geram audiência.
Apesar dos riscos e das estatísticas mostrarem uma escalada de sequelas causadas por quedas, falar em limitar a velocidade sempre foi um tabu nesse esporte. Os riscos são tão menosprezados no ciclismo de estrada, que até o início dos anos 2000, nem mesmo capacete era exigido pela UCI (Autoridade Internacional de Ciclismo).
O uso obrigatório do capacete foi implementado apenas em 2003, após a morte do cazaque Andrei Kivilev, aos 28 anos de idade, causada por fratura do crânio em acidente na prova Paris-Nice.
Diferentemente de outros esportes de alta velocidade, onde o corpo humano sempre foi protegido por um cockpit ou uma armadura, no ciclismo de estrada as quedas colocam o corpo em choque direto com o asfalto, postes e outros veículos. Escoriações profundas e fraturas causadas pela combinação da velocidade com a falta de proteção acontecem com frequência em competições profissionais e amadoras.
Segundo o site Pro Cycling Stats, o número de lesões em competições profissionais cresce intensamente desde 2020. Fratura de clavícula, de costelas, de vértebras e concussões são os registros mais frequentes. A pesquisa não aponta para causas, mas para muitos não há dúvida: a velocidade das bicicletas está cada vez maior.
Há duas semanas, em entrevista ao portal Sporza, o belga Wout van Aert, medalhista olímpico e tricampeão mundial de ciclocross, finalmente quebrou o tabu: “precisamos limitar as marchas das bicicletas, isso tornaria o esporte mais seguro.” A fala do belga vem após uma sequência de quedas graves que ele sofreu na temporada de 2024.
A iniciativa recebeu apoio do britânico Chris Froome, tetracampeão do Tour de France. Ele quase perdeu a vida em 2019 ao cair de sua bicicleta a 80 km/h, enquanto reconhecia o percurso do Critério de Dauphiné, na França. Sua reabilitação levou mais de um ano.
“Estamos vendo o esporte ir cada vez mais rápido. Em algum ponto teremos até mesmo que pensar em frear a tecnologia para aumentar a segurança. Isso poderia ser tão simples quanto limitar o alcance das nossas marchas”, disse Froome.
O debate contaminou os pelotões e gerou polêmica, com parte apoiando van Aert e Froome, e parte dizendo que limitar a velocidade vai contra a graça do esporte.
Fato é que as bicicletas estão mais rápidas e o corpo do ciclista é pouco protegido; e o pior: diferentemente de outros esportes de alta velocidade, tudo o que é feito no universo do ciclismo profissional pode ser replicado no universo amador, sem limitações.
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