Mais de dois anos após as eleições de 2022, o STF segue reinterpretando regras eleitorais e influenciando a composição da Câmara. Em novembro daquele ano, Podemos e PSB acionaram o tribunal contra o entendimento e aplicação da Justiça Eleitoral sobre os critérios de distribuição de cadeiras, tema só definido recentemente.
Até 2017, apenas partidos que atingissem o quociente eleitoral (QE) podiam receber cadeiras. No entanto, as coligações permitiam que partidos se unissem para atingir esse requisito, favorecendo a fragmentação partidária. Para reduzir esse problema e melhorar a governabilidade, o Congresso proibiu as coligações proporcionais a partir de 2020.
Como compensação, flexibilizou-se a exigência do QE, permitindo que qualquer partido participasse da distribuição de cadeiras. Em 2021, criou-se a federação partidária, instrumento semelhante às coligações, mas de abrangência nacional e duração mínima de quatro anos. Como contrapartida, restringiu-se a distribuição de cadeiras a partidos ou federações que atingissem pelo menos 80% do QE.
Em fevereiro de 2024 o STF derrubou essa restrição, permitindo que qualquer partido dispute vagas, mas optou por não alterar a composição da Câmara resultante da eleição de 2022.
A ação também questionava a exigência de votação mínima para candidatos. Desde 2015 candidatos precisam obter 10% do QE para ocupar uma cadeira. Em 2021 a exigência foi ampliada: 10% do QE nas cadeiras distribuídas pelo quociente partidário e 20% para a fase das sobras (ou maiores médias).
Essa dinâmica revela duas dificuldades do STF: compreender corretamente o funcionamento e o propósito da cláusula de barreira e do sistema proporcional.
Em 2006, o tribunal invalidou cláusula de barreira que exigia desempenho mínimo dos partidos para que pudessem ter funcionamento legislativo e receber recursos públicos.
A decisão desconsiderou que esse instrumento é comum e necessário em democracias que optam por adotar a representação proporcional. Alemanha, Israel e Nova Zelândia, por exemplo, adotam alguma cláusula desse tipo.
O ministro relator desta decisão, Marco Aurélio de Mello, disse que a medida era “esdrúxula” e “injusta”, afirmando que “coloca na vala comum partidos que não podem ser tidos como partidos de aluguel, como PPS, PC do B, PV e PSOL”. À época, a preocupação central foi com partidos afetados, e não com os impactos no sistema político ou com a constitucionalidade da regra.
Em 2020, questionou-se no STF a constitucionalidade da exigência de desempenho mínimo para candidatos e o tribunal optou pela manutenção da regra. O relator justificou que “o eleitor vota no candidato” e que a exclusão da regra beneficiaria candidatos com menos votos.
Desconsideraram que no sistema proporcional de lista aberta o eleitor vota na lista do partido, e apenas indica quem gostaria que ocupasse o topo da lista caso coubesse a ele a ordenação da mesma. Exigir desempenho mínimo dos candidatos, mas não dos partidos, distorce o sistema.
A postura do STF mostra um padrão: suas decisões oscilam conforme o contexto político, ainda que isso signifique alterar regras e composição das bancadas após anos de mandato transcorrido.
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